Um espetáculo de R$ 6 milhões. Esse é o orçamento para montar e circular com Cabaret, que estreia amanhã em Belo Horizonte, onde faz temporada até domingo. Os ingressos também têm preço considerável: de R$ 100 a R$ 220. Mesmo assim, o musical conseguiu aprovação na Lei Rouanet para captação de até R$ 4 milhões, sendo que a produção já levantou cerca de R$ 3 milhões. De acordo com lei, há a exigência de contrapartida social para a utilização dos recursos, o que, para os produtores, é coberto pela cota disponível de ingressos a “preços populares” (R$ 100).
Claudia Raia, estrela e uma das produtoras de Cabaret, chega a perder o humor ao falar sobre o preço dos ingressos e joga a culpa na meia-entrada. “Este é um problema sério no Brasil”, detecta a atriz, que diz não entender a criação do formato por aqui, sob o argumento de que não temos meio-salário. “A meia-entrada acaba com tudo”, afirma, admitindo, no entanto, ser favorável à cobrança de um percentual diferenciado para idosos e estudantes, “o que é perfeito e justo”.
“Adotar a meia-entrada sem limites, com 80% da casa pagando meia não dá. Claro que com bilheteria não se paga um espetáculo como Cabaret. Sem patrocínio, não o teria feito”, justifica a atriz, que tem como patrocinador um banco de investimento que, até então, como afirma, nunca havia investido em teatro. Da primeira vez, sozinha, a atriz não conseguiu aprovar o projeto no Ministério da Cultura, tendo apresentado nova proposta, que foi aprovada, ao lado do sócio Sandro Chaim.
Segundo Carlos Alberto de Deus, da produção local do espetáculo, eles estão trabalhando de acordo com o Sesc Palladium, que segue o que manda a atual legislação, reservando no mínimo 30% da lotação do teatro para a meia-entrada. “Pelo número de sessões vamos atender perfeitamente à cota da lei”, acredita o produtor mineiro.
Palco e tela Uma das precursoras do teatro musical feito no país, Claudia Raia comemora o sucesso do gênero em palcos brasileiros. Cabaret, o clássico da Broadway, foi também sucesso no cinema com direção de Bob Fosse. A megaprodução chega à capital depois de temporada de sucesso em palcos paulistas. Sob direção de José Possi Neto, a atriz vive a decadente prostituta Sally Bowles, que conquistou fãs mundo afora na pele de Liza Minnelli, enquanto o ator Jarbas Homem de Mello – já indicado ao Prêmio Shell na categoria de coadjuvante – vive o Mestre de Cerimônias (MC), seu partner em cena. Outros 19 atores, cantores e bailarinos completam a cena.
“Há mais de 20 anos vivo uma perseguição louca com a Sally e ela comigo”, afirma Claudia, que, em 1989, teve de recusar convite do diretor Jorge Takla para viver a personagem (Beth Goulart foi a escolhida), por estar fazendo novela. Desde então, Sally se tornou uma obsessão para a artista. “Além de extremamente carismática, ela lida com todo tipo de emoção ao mesmo tempo: vai da comédia ao drama, passando pelo tragicômico”, constata Claudia Raia. Para ela, Sally não é bi nem tripolar. “Ela é polipolar”, empolga-se a atriz, que chega ao teatro com pelo menos três horas de antecedência para incorporar a personagem.
“Além do aquecimento vocal e corporal, ainda tenho uma aula de balé clássico. Fora a maquiagem, que dá muito trabalho”, justifica Claudia, que diz ter sido uma das primeiras a acreditar e a insistir no potencial do musical brasileiro. “Na verdade, tinham tudo a ver com o país. Foi por meio da revista que a gente quis trazer a Broadway para perto da gente”, afirma. “O Brasil é um país extremamente musical, com um povo alegre e festivo. Não por acaso, temos o melhor musical do mundo, que é o carnaval. Tinha certeza absoluta da aceitação do gênero por aqui”, orgulha-se a atriz, atribuindo o atual sucesso do gênero às amigas atrizes Bibi Ferreira e Marília Pêra, além de diretores como Takla e à dupla Charles Moëller e Claudio Botelho.
“Eles sempre fizeram e lutaram pelo musical no Brasil. Está aí a resposta de boa qualidade, com equipe técnica, atores, cantores e bailarinos que não deixam nada a desejar. Anteriormente, mal conseguíamos montar um elenco de musical no país”, constata Claudia, que estreou no gênero em 1984, na montagem de A chorus line.
“Não adianta infiltrar, tem de haver certa adaptação mesmo das letras. O que nós conseguimos em Cabaret é exemplo disso”, comemora a atriz, que entregou a adaptação do original de Joe Masteroff (com músicas de John Kander e letras de Fred Ebb) ao amigo Miguel Falabella. “Vertemos a obra inteiramente. O Miguel fez um outro espetáculo”, afirma Claudia Raia, atribuindo à “junção” do melhor de Cabaret feita pelo amigo o sucesso da atual montagem, sem ignorar o cenário histórico em que se desenvolve a trama, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, em pleno nascedouro do nazismo.
Para a atriz, o que fascina em Cabaret é o fato de a trama do musical ter peso. “Na maioria dos musicais, as histórias normalmente são leves. Aqui não, ela é densa. Retrata seres mundanos da noite em um momento em que a raça humana estava à beira do abismo. O enredo se desenvolve em uma Alemanha transformada pela ascensão do nazismo, com judeus e minorias acossados”, conta Claudia. Na versão cinematográfica do musical “tudo foi devidamente amenizado, porque havia um grande estúdio pressionando o diretor Bob Fosse”. “Nós carregamos mais nas tintas”, garante.
Números de Cabaret
7
toneladas de cenário
150
figurinos (Claudia Raia usa 10 deles, com nove trocas de roupa)
20 mil
pedras de cristais bordados à mão tem o vestido usado pela atriz em Grana (Money)
80
profissionais envolvidos, entre artistas e técnicos
40
perucas usadas pelo elenco
16
músicos na orquestra, além da maestrina
Humor e política
O fato de o Brasil já fazer musicais, independentemente da franquia americana (compra-se o libreto e o texto, que ganha nova direção no país), faz o ator Jarbas Homem de Mello comemorar. “Acredito até que já possamos falar em uma escola brasileira de musicais”. Atualmente, há pelo menos 10 espetáculos do gênero em cartaz no país.
Maior papel de carreira de Jarbas, o MC que ele faz em Cabaret é “cruel, engraçado, clownesco e emocionante ao mesmo tempo”. E completa: “Trata-se de personagem realista e nós tentamos imprimir o contexto da época, dando ao mesmo tempo a ele uma contemporaneidade”. Jarbas diz estar fazendo um Mestre de Cerimônias “mais agressivo e mais sexualizado”, conseguindo por isso se comunicar mais com o público. A escolha do ator para a montagem foi exigência de Claudia Raia, que elogia a experiência do colega de palco.
Cabaret
Amanhã e sexta-feira, às 21h; sábado, às 17h e às 21h30; domingo, às 16h30 e às 20h. Teatro Sesc Palladium, Rua Rio de Janeiro, 1046, Centro.
Ingressos de R$ 100 a R$ 220. Duração: 2h30. Censura: 14 anos.
Informações: (31) 3214-5350.
Fonte: Uai
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